terça-feira, 6 de maio de 2014

O Estado está morto

     Um crime bárbaro aconteceu no fim de semana. Uma mulher foi espancada até a morte por ser confundida com uma sequestradora de crianças em Guarujá. Detalhe: a população local sequer sabe se a tal sequestradora existe mesmo.
     Recentemente, homens foram amarrados a postes no Rio de Janeiro por populares, sob alegação de que seriam ladrões.
     Parece que parte da população brasileira resolveu fazer justiça com as próprias mãos. É crime, mas a certeza da impunidade é mais forte do que a crença nas leis e no poder público.
     Deve ter sido o mesmo motivo que levou alguém a jogar um vaso sanitário de um estádio de futebol na torcida adversária, em Recife, matando uma pessoa. O mesmo motivo que leva pessoas a incendiarem ônibus como forma de protesto.
     O que todos esses fatos têm em comum? O cansaço com ineficiência do Estado brasileiro. A descrença completa e total nas instituições públicas. A falência de uma nação.
     As manifestações públicas de junho do ano passado não receberam a leitura correta por parte da classe política brasileira, seja ela de oposição ou situação.
     As pessoas foram às ruas para pedir um país novo. Um país eficiente, com serviços públicos de qualidade, com o fim da impunidade e da corrupção.
     As pessoas de bem, que eram maioria naquelas manifestações, estão cansadas de um país que, tal como um bêbado cambaleando nas ruas, não encontra seu caminho.
     Desde junho do ano passado, temos um Brasil, mais violento, com mais conflitos, e com justiceiros que acreditam que podem cometer seus crimes impunemente.
     Os doutores dos palácios e dos assentos macios do Congresso Nacional, das assembleias legislativas e das câmaras municipais não estão interessados na leitura das ruas, a menos que ela signifique votos ou vantagens. E a elite? Ah, a elite... boa parte dela blinda seus carrões, vai morar em castelos medievais e seguros chamados condomínios ou simplesmente encontra a saída no aeroporto. Grande parte da elite brasileira sempre foi covarde, desde o descobrimento do país, há 500 anos. Se resolvesse, toda ela, pegar o caminho do aeroporto, talvez fizesse um bem ao país.
     O brasileiro cansou. Cansou de pagar o pato e impostos que nunca voltam em forma de benefícios. O Estado brasileiro está desacreditado. Está na lama. E, quando isso acontece, abrem-se as portas para o imprevisível. O surgimento de justiceiros é um desses fatos imprevisíveis. Se não forem contidos agora, continuaremos a ver crimes bárbaros e covardes como o de Guarujá.
     Mas a falência do Estado é ainda mais perigosa.
     Ela abre espaço para salvadores da pátria que, quase que surgidos do nada, prometem a redenção. Abre espaço para movimentos que pedem a volta de regimes de exceção (sim, esses movimentos estão ocorrendo). A falência do Estado mata a esperança do cidadão brasileiro num país melhor. E, sem esperança, sem Estado e sem leis, resta o vandalismo, os justiceiros, os crimes.
     O Estado brasileiro está morto porque aqueles que seriam responsável pela sua existência estão, e sempre estiveram, preocupados demais em pilhar e saquear o que estiver à mão. Porque acreditam na impunidade. Acreditam na estupidez do povo. Não são capazes de perceber que o buraco é mais embaixo. São tão burros que não percebem que seria preferível dar os anéis (saúde, educação, segurança, combate à corrupção) e manter os dedos.
Ah, mas temos a Copa. Ainda bem.

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